ESTADO DA PARAÍBA
CÂMARA MUNICIPAL DE JOÃO PESSOA
CASA DE NAPOLEÃO LAUREANO
Outros
Outros Nº PARECER Nº101/2022
20/09/2022
Parecer nº 101/2022
Requerente: Presidente da Mesa Diretora
Assunto: Consulta sobre possibilidade de concessão de licença parlamentar a vereador suplente para tratar de assunto particular pelo prazo de 121 dias
PARECER JURÍDICO
CONSULTA – LICENÇA PARLAMENTAR PARA TRATO DE ASSUNTO PARTICULAR POR MAIS DE 120 DIAS – VEREADOR SUPLENTE. IMPOSSIBILIDADE DE RETORNO DO TITULAR ANTES DO TÉRMINO DO PRAZO DA LICENÇA. PRECEDENTE DO STF. LICENÇA DO SUPLENTE POR PERÍODO QUE EXCEDE A PREVISÃO DE PRAZO DO MANDATO. IMPOSSIBILIDADE. EXPECTATIVA DE DIREITO DO SUPLENTE DE VEREADOR. PRECARIEDADE DO MANDATO. INTERPRETAÇÃO REGIMENTAL. MATÉRIA INTERNA CORPORIS.
I - RELATÓRIO
Cuida a demanda de consulta formulada pela Diretoria Legislativa desta Câmara Municipal, em que relata o Requerimento de Licença para o trato de interesses pessoais por 121 (cento e vinte e um dias) apresentado pelo Vereador Niedson dos Santos Miguel, em 25 de agosto de 2022.
Informa ainda que o requerente foi empossado no cargo de Vereador, atendendo a Convocação de Suplente nº 06/2022, tomando posse também no dia 25 de agosto, em decorrência da concessão de licença para cuidar de interesses pessoais, por 121 dias, do Vereador Carlos Gustavo de Oliveira Gomes, efetivada por meio da Resolução nº 202/2022, de 18 de agosto de 2022.
Em vista das circunstâncias acima relatadas, o Consulente aduz que a concessão da licença no prazo requerido pelo Vereador Niedson ultrapassaria a previsão de vigência do seu mandato, considerando que a licença do vereador titular se encerra em 18 de dezembro de 2022, quando retornaria automaticamente ao seu cargo.
Esta procuradoria foi instada a se manifestar sobre a possibilidade de concessão da licença e deferimento do requerimento em tela. É o relatório. Passamos a opinar.
II – FUNDAMENTAÇÃO
A Lei Orgânica do Município e o Regimento Interno da Câmara Municipal de João Pessoa prevêem expressamente a possibilidade de o Vereador se licenciar do exercício de suas funções para tratar de assuntos particulares ou interesses pessoais. Nos termos dos arts. 141 e 143 do RI:
Art. 141 O Vereador poderá licenciar-se somente:
I - por motivo de doença devidamente comprovada;
II - em face de licença gestante ou paternidade;
III - para desempenhar missões de caráter oficial e temporárias de interesse do Município, pelo prazo de até 30 dias;
IV - para cuidar de interesse pessoal, ficando suspenso o recebimento da sua remuneração de Vereador;
V - para assumir o cargo de Ministro, de Secretário ou Secretário Adjunto de Estado ou de Município, Dirigente Máximo de Autarquias, Fundações, Empresas e Sociedade de Economia Mista da União, Estado ou Município; (Alterado pela Resolução nº 120/2015)
VI - para assumir, na condição de suplente de cargo ou mandato público eletivo estadual ou federal, pelo tempo em que durar o afastamento ou licença do titular, ficando suspenso o recebimento da sua remuneração de Vereador. (Acrescentado pela Resolução nº 120/2015)
Art. 143 Somente se convocará suplentes nos casos de vaga em virtude de morte, renúncia, licença gestante, para tratamento de saúde e interesses particulares, desde que a duração da licença seja superior a 120 (cento e vinte) dias.
O artigo 143 do Regimento Interno dispõe que o suplente de vereador deverá ser convocado somente nos casos de vacância do cargo ou licença superior a 120 dias, como é o caso do Vereador Niedson dos Santos, que tomou posse em razão da licença de 121 dias concedida ao titular do cargo, Vereador Carlos Gustavo (Guga), fundada no art. 141, IV, do RI.
A respeito da investidura do suplente, o ilustre constitucionalista José Afonso da Silva entende que “o suplente, a rigor, só tem expectativa de direito, que é a de suceder o titular de sua legenda ou de substituí-lo. Em certos casos, porém, essa expectativa se transforma em direito subjetivo, isto é, exigível judicialmente. Isso ocorre quando se dá vaga do mandato do titular, ou esse se afasta para investidura numa das funções previstas no artigo, ou em licença por mais de 120 dias, e o interessado é o primeiro da lista dos suplentes. Nesse caso, tem ele o direito subjetivo de ocupar em definitivo o lugar do titular na hipótese da vaga ou substituí-lo durante o período de afastamento nas demais hipóteses indicadas.( “Comentário Contextual à Constituição” 4ª edição, São Paulo: Ed. Malheiros, 2007, p. 426)(gn).
Nesse sentido, entende-se que o suplente que toma posse em razão de licença por tempo determinado (superior a 120 dias) do titular do cargo, não ocupa este cargo de forma definitiva, em razão da temporariedade do afastamento que deu causa à sua investidura, o que confere um caráter de precariedade a essa assunção.
“Observe-se que a situação daquele que assume precariamente o mandato, do qual poderá ser destituído a qualquer tempo pelo retorno do seu titular, é diferente daquele que é chamado para assumi-lo em caráter definitivo, em situações de vacância permanente.
(...)
Numa análise preliminar, aparentemente, o suplente, ao assumir temporariamente o mandato, nos termos do § 1º do art. 56 da CF, não passa a ser titular do mandato, haja vista que essa assunção seria precária, durando apenas o tempo necessário para o afastamento daquele que efetivamente o detém.
Por isso, entendo que a melhor interpretação da disposição constante no art. 54, II, “d”, deve ser aquela que restringe o seu alcance apenas aos Deputados que titularizam mais de um cargo ou mandato público eletivo, mantendo os plenos poderes do seu regular exercício sobre ambos. (Trecho do Voto do Ministro Ricardo Lewandowski ao julgar medida cautelar no MS 33.952)
No caso dos autos, em razão da transitoriedade e precariedade do mandato do Vereador Niedson dos Santos, que ocupará o cargo até o dia 17 de dezembro de 2022, termo final da licença de 121 dias do Vereador Guga, entendemos que não poderá ser concedida a licença do art. 141, IV, do RI pelo mesmo prazo de 121 dias, pois esse prazo excederia o próprio período de mandato do Vereador suplente, que se iniciou em 25 de agosto de 2022.
A partir do dia 17 de dezembro de 2022 o requerente voltará a ter apenas expectativa de direito de assumir o mandato caso o titular volte a se licenciar ou caso ocorra qualquer outra forma de vacância.
Desse modo, a licença apenas poderá ser deferida por prazo inferior a 121 dias, não podendo ultrapassar o termo previsto para o final do mandato do requerente, pois o seu direito subjetivo de substituto eventual está atrelado ao término da licença do titular.
Assim, pelas razões expostas, opina-se pelo indeferimento da licença nos moldes requeridos.
Indo um pouco além do objeto desta consulta, convém destacar que a licença para o trato de assuntos particulares, com prazo superior a 120 dias, quando requerida de forma irretratável, vincula o seu requerente no prazo estabelecido, não podendo o titular do mandato pretender retornar ao cargo antes de findo esse prazo, em razão da segurança jurídica que deve ser garantida ao suplente de vereador.
Esse entendimento foi adotado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento do MS 35.016/DF, conforme trecho da decisão a seguir:
“10. A natureza interna corporis do ato tido como coator, quanto à autonomia constitucional da Câmara dos Deputados, à sua organização interna e à concessão de licenças e preenchimento da vaga surgida, não é superada pelo argumento de afronta à soberania popular manifestada pelo voto do eleitor, também resguardada a ordem sucessória das suplências, definida no momento da diplomação. A coligação partidária é instituição assecuratória da manutenção dos cargos conquistados nas eleições, incluídos os que se venham a ficarem sem o desempenho do titular por situação de vacância ou impedimento, na ordem proclamada pela Justiça Eleitoral
Nesse contexto, a irretratabilidade do pedido de afastamento feito pelo titular da vaga, fundada na convocação do suplente para assumi-la, confere segurança jurídica ao suplente pelo prazo mínimo de cento e vinte dias (art. 56, § 1º, da Constituição da República), além de preservar sua independência com relação ao parlamentar licenciado, inviabilizando o cancelamento da licença por discordância circunstancial com o alinhamento político do suplente convocado para assumir a vaga.
(...)
11. Descabida, ainda, a equiparação da situação do parlamentar licenciado por motivo de doença ou para tratar de interesse particular com aquele afastado para ocupar cargo no Poder Executivo, cuja natureza comissionada da função assumida em cargo demissível ad nutum justifica seu retorno ao cargo parlamentar a qualquer tempo. A diferenciação dessas situações no texto constitucional demonstra o equívoco da argumentação desenvolvida na petição inicial. 12. Pelo exposto, na esteira da legislação vigente e da consolidada jurisprudência deste Supremo Tribunal na matéria, indefiro este mandado de segurança (art. 10 da Lei n. 12.016/2009), prejudicado, por óbvio, o requerimento de medida liminar”
Em arremate, girando o debate em torno de questões eminentemente afetas à interpretação regimental, entendemos que compete exclusivamente ao Presidente da Mesa Diretora da Câmara Municipal conferir a exegese da matéria interna corporis, opinando esta Procuradoria pelo indeferimento do pedido de licença trazido à baila como também pelo indeferimento de eventuais requerimentos de retorno de parlamentares antes de expirado o prazo de licença para o trato de assuntos pessoais que tenham sido formalizados de forma irretratável por prazo superior a 120 (cento e vinte) dias.
III – CONCLUSÃO
Ante as razões expendidas, opina-se pelo indeferimento de licença para trato de interesses pessoais do Vereador Niedson dos Santos Miguel, nos moldes do requerimento nº 001/2022, podendo ser concedida por prazo que não exceda o termo final previsto para o mandato.
Salvo melhor juízo,
É o parecer.
Procuradoria, João Pessoa, 08 de setembro de 2022.
RODRIGO NÓBREGA FARIAS YANA ALMEIDA CAMBOIM
PROCURADOR-GERAL PROCURADORA
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